Carregando

Aguarde, processando!

Guia completo para apreciar CHAMPAGNE

Guia completo para apreciar CHAMPAGNE

23/12/2019

Marcelo Copello

Champagne

6894 Visitas

É inimaginável um réveillon sem vinhos espumantes e nesta categoria, o champanhe é a grande referência mundial. Sabendo disso a seguir vamos ver vários detalhes sobre o nobre espumante francês.

Antes de seguir é bom deixar claro que nem todo vinho espumante pode ser chamado de champanhe (ou, na grafia francesa: “champagne”). “O” champanhe (no masculino e em minúcula) é o vinho espumante feito exclusivamente na região de Champanhe, ou “a” Champanhe (no feminino e em maiúscula).

La Champagne

A região de Champanhe, ou “La Champagne” se localiza a 145 Km a nordeste de Paris. É a região vinícola mais ao norte da França (48-49,5ºN de latitude), de clima frio e úmido, com influência marítima e continental ao mesmo tempo. A temperatura média anual é de 19oC, com cerca de 650mm de chuvas. O solo é predominantemente calcário, que permite boa drenagem. Os vinhedos geralmente são colinares, aproveitando melhor a luz do sol. As altitudes são modestas, e vão de 60 a 360 metros. A produção de champanhe hoje se aproxima das 400 milhões de garrafas ao ano.

Uvas

O champanhe é feito sempre a partir de três castas (solo ou misturadas). As tintas pinot noir e pinot meunier (das quais se faz um vinho branco) e a branca chardonnay. Geralmente as tintas emprestam à mistura caráter mais austero, mais corpo, aromas de frutas vermelhas, enquanto a chardonnay dá mais cremosidade e elegância.

Como se formam as bolhas

O champanhe é sempre o produto de duas fermentações. Primeiro elabora-se um “vinho base” que será refermentado, ganhando espuma. A fermentação alcoólica é a reação química de transformação dos açúcares da uva e álcool. Um dos produtos desta reação química é o gás carbônico. Quanto esta fermentação é feita em recipientes hermeticamente fechados (no caso a garrafa do espumante) este gás se dissolve no líquido, e só é liberado quando “estouramos” a rolha!

Método de elaboração ou champanhização

Os principais métodos de elaboração de vinhos espumantes em todo o mundo são o champenoise e o charmat. Na região de Champanhe só é permitido o uso do método champenoise, no qual a segunda fermentação é feita na própria garrafa. No método charmat a 2ª fermentação acontece em grandes recipientes de inox. Geralmente os champanoise são mais finos e de perlage de melhor qualidade.

Perlage - É conjunto de borbulhas do espumante. Quanto menores as bolinhas e mais abundantes melhor, o espumante será mais fino e agradável no palato.

Corte ou assemblage - É o primeiro passo na elaboração do champanhe. É a mistura de diversos “vinhos base” que serão refermentados para se tornar o champanhe. As maisons (casas produtoras de champanhe) produzem ou compram uvas de vários vilarejos e misturam os vinhos produzidos para elaborar seus assemblages ou cortes, que resultarão no nobre espumante. Um assemblage pode ser uma mistura de dezenas de vinhos (às vezes mais de 100), de uvas provenientes de vários vilarejos e de safras diferentes.

Licor de tirage e 2a fermentação ou Prise de Mousse

O vinho base passa então por uma segunda fermentação, também chamada de tomada de espuma ou prise de mousse, que o transforma em es­pumante. Isto acontece dentro da garrafa definitiva, a mesma em que depois será co­mer­cia­li­zado. O vi­nho base é colocado dentro da garrafa com o licor de tirage – formado por açúcar e vi­nho no qual foram cultivadas leveduras treinadas especialmente para produzirem um bom champanhe. Es­tas leveduras constituem um dos segredos dos produtores. A garrafa é então fechada com uma “cha­pi­nha” provisória. A tomada de espuma dura cerca de três meses. Ao fim deste tempo, pode-se ver no fundo das gar­ra­fas (deitadas) as borras depositadas. A etapa seguinte é o tempo de amadurecimento do espumante com suas borras.

Borras

As borras são as células mortas das leveduras que processaram a segunda fermentação do espumante na garrafa. Estas células com o tempo se dissolvem no líquido em um processo chamado de autólise. Este “tempo com as borras” ou “tempo sur lie”, ou “tempo de autólise” é o tempo que o espumante permaneceu com suas borras. Quanto maior o tempo maior o corpo, complexidade e cremosidade. Este tempo normalmente dura de seis meses à cinco anos. Ao final desta etapa o líquido não pode ser simplesmente filtrado pois, se aberta a garrafa, este perderia seu precioso perlage. Este problema é resolvido através do re­muage e do dégorgement, explicados a seguir.

Autólise - É o rompimento das células mortas das leveduras da segunda fermentação. A autólise cria aminoácidos, que são os precursores da complexidade de aromas, corpo e cremosidade do espumante.

Remuage - É um processo lento e delicado. As borras são leves e tur­vam o vinho ao menor movimento. As garrafas são colocadas em cavaletes especiais de madeira cha­ma­dos pupitres, dotados de furos ovalados onde são introduzidas horizontalmente as garrafas. O remuer, profissional especializado nesta tarefa, passa periodicamente pelos pupitres fa­zendo o giro de 90 graus nas garrafas e ao mesmo tempo colocando-as um pouco mais in­cli­nadas para baixo, de modo que as leveduras mortas vão aos poucos sendo levadas para o gar­ga­lo. Quando as gar­ra­fas estiverem bastante inclinadas para baixo, as leveduras já estarão quase sobre a tampinha. Este pro­ces­so dura cerca de dois meses, ou cerca de uma semana se feito mecanicamente.

Dégorgement ou disgorgement - Após a remuage a garrafa está com os sedimentos no gargalo, que é congelado e expelido por pressão no método conhecido como dégorgement ou disgorgement. A mesma máquina que retira o sedimento congelado acrescenta o licor de expedição (liqueur d’expédition).

Licor de expedição. Ao final do processo de elaboração do champanhe, licor de expedição é acrescentado, uma espécie de xarope que irá determinar “dosagem” de doçura do champanhe. É bom lembrar que a sensação final de doçura também depende de outros fatores, como a acidez do espumante, que poderá compensar maiores teores de açúcar.

A classificação do champanhe quanto ao teor de açúcar é:

Brut Nature      – de zero até 3 gramas de açúcar residual por litro (g/l), este açúcar é natural e não adicionado no licor de expedição.

Extra-brut         – até 6 g/l

Brut                  – até de 12 g/l

Extra Dry          – de 12 a 17 g/l

Dry                      – de 17 a 32 g/l

Demi-sec         – de 32 a 50 g/l

Doux                – mais de 50 g/l

O Brut Nature também pode ser chamado por alguns outros nomes como “Pas Dosé”, “Brut Sauvage”, “Brut Zéro”, “Dosage Zéro”, “Brut Intégral”, “Brut Non-Dosé”, etc.

Reação de Maillard - A interação entre aminoácidos formados na autólise e o açúcar da dosagem é chamada de “reação de Maillard” e é responsável por muitos aromas que se formarão ao longo do envelhecimento do champanhe em garrafa. 

Blanc de Blancs - é o espumante branco elaborado apenas com uvas brancas, a chardonnay.

Blanc de Noirs - é o espumante branco elaborado apenas com uvas tintas, pinot noir e pinot meunier (pode ser apenas uma ou mistura das duas). 

Rosé - o champanhe rosé é uma categoria nobre, muitas vezes alcançando preços maiores que os brancos. Pode ser feito a partir da mistura de vinho branco com tinto. Champanhe é uma das poucas denominações que permite fazer rosé dessa forma.

Tipos de champanhe:

NV ou sans année – são os champanhes que não trazem o ano (safra) no rótulo, pois compostos são compostos por misturas de vinhos base de várias safras. A maioria dos champanhes está nesta categoria. Normalmente o potencial de envelhecimento é pequeno. É para ser comprado e consumido em um máximo de cinco anos, de preferência menos.

Millésimes ou vintage – elaborado com vinhos de apenas uma safra, geralmente só feito nos melhores anos. Normalmente tem bom potencial de guarda, de cinco a quinze anos, podendo ser bem mais, caso de um bom produtor e de uma boa safra e se a garrafa for conservada climatizada.

Cuvée de Prestige – é como chamamos os vinhos topo de linha de cada casa produtora de champanhe. O Dom Pérignon (feito por Möet & Chandon), Cristal (elaborada por Louis Roederer) e Belle Époque (por Perrier-Jouët), são exemplos. São produzidos em quantidades menores e seu preço é determinado pela sua raridade. Normalmente a capacidade de guarda destes champanhes pode ser de várias décadas.

Cuvée - Originalmente o termo se refere ao vinho de um recipiente ou cuvée. Hoje o termo se refere a um corte específico ou um produto, um champanhe, que pode ser a mistura de vários recipientes ou vários cuvées.

Temperatura de serviço

A temperatura ideal para consumir o champanhe é entre 6-8o C para os NV e  8-10oC para os champanhes especiais. Alguns champanhes mais delicados ou envelhecidos podem ganhar se degustados um pouco menos gelados, digamos a 10-12oC.

AROMAS

Aromas de Leveduras - Alguns aromas são muito típicos dos espumantes, os aromas de leveduras ou fermentos, que provém da autólise. Muitas vezes degustadores também se referem a estes aromas como casca de pão, pão torrado, torradas ou brioches.

Outros aromas - Aromas de frutas frescas são também muito comuns. Frutas amarelas são mais típicas em blancs de blancs, frutas vermelhas nos blanc de noirs e nos rosados, e cítricos são comuns no geral.  Aromas de mel, amêndoas, avelãs, nozes são mais comuns em espumantes com alguma idade.

Lendo os rótulos

Os rótulos dos champanhes trazem sempre duas letrinhas pequenas, descrevendo a categoria do produtor, que pode ser:

NM: “Négociant Manipulant”. Empresas que compram uvas de outros produtores e elaboram seus vinhos. As grandes marcas de champanhe normalmente encontram-se nesta categoria.

RM: “Récoltant Manipulant”. Empresa que possui vinhedos, e controla todo o processo, produzindo com uvas próprias e comercializando seu próprio champanhe.

CM: “Coopérative Manipulant”. Cooperativas que fazem vinhos com uvas de produtores membros. 

RC: “Récoltant Coopérateur”. Membros de uma cooperativa que vendem os champanhes produzidos por outras cooperativas com o seu próprio nome/rótulo.

MA: “Marque Auxiliaire”. Uma marca sem vínculo com o produtor, pertencente a, por exemplo, um supermercado.

SR: “Société de récoltants”. Uma associação de viticultores produzindo em conjunto uma marca de champanhe mas que não formam uma cooperativa.

ND: “Négociant distributeur”. Um negociante de vinhos que adquire o champanhe pronto e comercializa com sua marca própria.

Tamanho da garrafa

Champanhe é uma bebida tão social que inspira a produção de garrafas grandes, que seguem os nomes abaixo.

Capacidasde                           Equivalente                       Nome da garrafa
(em litros)                                em garrafas  
0,187                                              1/4                                   Quart
0,375                                              1/2                                   Demi
0,750                                              1                                      Bouteille
1,5                                                  2                                      Magnum
3                                                     4                                     Jéroboam
4.5                                                  6                                     Rehoboam
6                                                     8                                     Matusalém
9                                                    12                                    Salmanazar
12                                                  16                                    Baltazar
15                                                  20                                    Nabucodonozor
24                                                  32                                    Salomão

Tempo de Guarda - Aconselha-se beber os champanhes NV dentro de um ano ou máximo de cinco anos. Os champanhes especiais, os millésimes e cuvées de prestige são capazes envelhecer por décadas e ganhar grande complexidade (assim como seus apreciadores, saúde!).

Marcelo Copello

Marcelo Copello


Marcelo Copello é um dos principais formadores de opinião da indústria do vinho no Brasil, com expressiva carreira internacional. Eleito “O MAIS INFLUENTE JORNALISTA DE VINHOS DO BRASIL” pela revista Meininger´s Wine Business International, e “Personalidade do Vinho” 2011 e 2013 pelo site Enoeventos.

Curador do RIO WINE AND FOOD FESTIVAL, e Publisher do Anuário Vinhos do Brasil, colaborador de diversos veículos de imprensa, colunista da revista Veja Rio online. Professor da FGV, apresentador de rádio e TV, jurado em concursos internacionais de vinho, como o International Wine Challenge (Londres). Copello tem 6 livros publicados, em português, espanhol e inglês, vencedor do prêmio Gourmand World Cookbook Award 2009 em Paris e indicado ao prêmio Jabuti.

Especialista no mercado e nos negócios do vinhos, fazendo palestras no Brasil e no exterior, em eventos como a London Wine Fair (Londres). Copello é hoje um dos palestrantes mais requisitados. Para saber mais sobre as palestras e serviços de Copello clique AQUI

  

Contato: contato@marcelocopello.com