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Vinho e Carne, mitos e verdades

Vinho e Carne, mitos e verdades

03/02/2018

Marcelo Copello

Mundo do Vinho

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Por Marcelo Copello

"Há mais coisas entre o céu da boca e a língua do que ousa sonhar nossa vã gastronomia". MC

Talvez o alimento mais citado quando se fala em harmonização com vinho é a carne. Este protagonismo é merecido, um tinto e uma bela carne formam um par sensacional, mas normalmente este casamento é tratado de forma genérica “carne com tinto”. 

A realidade contudo é bem mais complexa que isso. Centenas de novos compostos aromáticos se formam nas reações químicas que se processam no cozimento da carne.

Alimentação do gado também faz diferença. Os alimentados com pasto são mais saborosos dos que os alimentados com ração (grãos). O pasto tem muitos compostos que transformam em compostos aromáticos no momento da preparação da carne, tornando-os pratos mais saborosos e complexos.

Vamos hoje abrir esta caixa preta dos muitos tipos de carne e seus preparos e seu matrimônio com os vinhos.

Antes de prosseguir, uma dica

Erro: fala-se a proteína e a gordura da carne vermelha amaciam os taninos dos vinhos tintos. Isso é falso. Em uma carne o que amacia taninos é o SAL. Tente comer carne sem sal e o vinho parecerá amargo!

Carne de gado que pasta

Este tipo de carne, hoje em dia cada vez mais rara, é mais aromática. Traz naturalmente notas aromáticas florais,  que podem ser de jasmim, flor de laranjeira, ou mesmo de beterraba. Experimente preparar estas carnes especiarias, ervas e com caldos vegetais, onde pode ser colocado por exemplo beterraba e chá de jasmim – você vai se surpreender como os aromas vão saltar do prato.

Para harmonizar com vinhos experimente um tinto que traga estes aromas de flores e ervas, como um Touriga Nacional português ou um Shiraz australiano, ou um Malbec Argentino de altitude.

Carne de gado alimentado com ração

Este tipo de carne é menos perfumada e tem aroma animal mais intenso, pode ser acompanhada por vinhos menos aromáticos e um pouco mais rústicos, como um tinto das Mourvèdre, Carmenere, Bonarda argentinos, Malbecs do Cahors, brasileiros de castas como Teroldego, Ancellotta, Marselan,.

Carne Maturada

A carne maturada ganha mais amino-ácidos, acentuando o sabor que chamamos de “Umami”, tem também mais textura e profundidade de sabores e aromas.

Pede tintos encorpados, de clima quente, com bom volume de taninos doces, como os Zinfaldel (Califórnia), Syrah (Chile), Nero d’Avola (Sicilia), Monastrel (Espanha).

Carne crua

A carne crua, um tartar por exemplo, terá menos aromas e sabores e será mais ácida. Surpreendentemente ficará melhor com vinhos brancos do que com tintos. Experimente com um bom brancos de médio corpo, rico em aroma e com alguma idade (um bom Chardonnay barricado maduro), ou tintos leves e sem madeira, como um Cabernet Franc (vale do Loire, Brasil) ou um Gamay (França).

Angus/Kobe/Wagyu

Uma das melhores raças de gado, a Wagyu, traz aromas ainda mais complexos. O gado desenvolve em sua digestão mais terpenos (compostos aromáticos), com notas florais e de especiarias. Desenvolve também notas semelhantes a dos vinhos amadurecidos em barricas de carvalho: defumados, notas animais, além de notas de nozes e cebola. Este tipo de carne desenvolve muitos amino-ácidos, umami, dando volume e textura ao sabor.

Sugiro para este caso tintos de bom corpo (não muito encorpado), rico de aromas, com notas de especiarias e florais, e amadurecidos em carvalho. Que tal um Pinot Noir de maior estrutura do Novo Mundo? Um belo tinto do Dão-Portugal? Um Barbera do Piemonte?

Carne grelhada/tostada

A tosta na carne pede taninos jovens e madeira nova nos vinhos. Que tal um Cabernet Sauvignon (um Bordeaux jovem e potente), um Tempraniillo espanhol, ou um Sangiovese da Toscana?

Carne cozida em água

A carne cozida perde sua suculência e ganha sabores dos ingredientes que estavam no cozimento. Neste caso pede menos taninosos, tintos mais leves ou mesmo brancos encorpados com acidez moderada ou baixa. A escolha final depende muito dos ingredientes com os quais a carne foi cozida – uma dica é observar os aromas dos destes ingredientes.

Sugestão de vinhos: tintos mais leves e sem madeira ou mesmo brancos, como Valpolicella, Gamay, Riesling da Alsacia

Carne cozida em vinho

Um de meus pratos prediletos é carne longamente cozida em vinho, por horas.  A carne cresce, pega muito sabor, sua textura fica macia, quase pegajosa e muitas vezes até se desfaz. Este preparo pede vinhos potentes, ricos, estruturados, como um Amarone (Venato-Itália), um Syrah Australiano ou um Alentejano da casta Alicante Bouschet.

Carnes de Caça

Nas caças as palavras chaves são “complexidade” e “especiarias”. Tente vinhos com longo amadurecimento em madeira mas ao mesmo tempo mais maduros e delicados, de safras mais antigas se possível. Barolo, Babaresco (Itália), Borgonha, Hermitage (França), Rioja (Espanha).

DICA: para temperar carnes de caça e torná-las ainda mais amigos do vinho use para temperar uma infusão feita em azeite com canela, gengibre e cardamomo.

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Cordeiro

Para preparar um cordeiro a palavra chave é ALECRIM ou TOMILHO, que contem compostos do cordeiro. Melhor que o clássico Bordeaux seria um vinho mais mediterrâneo, mais quente, que tal um Chateauneuf-du-Pape ou um Carignan do Maule (Chile)

Porco

Para a carne do porco a palavra chave é COCO. As lactonas, um dos principais compostos aromáticos da carne de porco, também são encontradas em outros alimentos como mel, caramelo, abricó,pêssego, manteiga e principalmente no côco. Para carne de porco em geral pede-se um vinho branco, de preferencia da casta Viognier, ou brancos do Rhône das castas Marsanne e Roussane. Um Chardonnay barricado também ficará bom. Quem preferir tintos opte pelos mais leves e sem madeira

Uma combinação clássica é o presunto crú, tipo Parma ou Pata Negra, com um Jerez Fino.

Marcelo Copello

Marcelo Copello


Marcelo Copello é um dos principais formadores de opinião da indústria do vinho no Brasil, com expressiva carreira internacional. Eleito “O MAIS INFLUENTE JORNALISTA DE VINHOS DO BRASIL” pela revista Meininger´s Wine Business International, e “Personalidade do Vinho” 2011 e 2013 pelo site Enoeventos.

Curador do RIO WINE AND FOOD FESTIVAL, e Publisher do Anuário Vinhos do Brasil, colaborador de diversos veículos de imprensa, colunista da revista Veja Rio online. Professor da FGV, apresentador de rádio e TV, jurado em concursos internacionais de vinho, como o International Wine Challenge (Londres). Copello tem 6 livros publicados, em português, espanhol e inglês, vencedor do prêmio Gourmand World Cookbook Award 2009 em Paris e indicado ao prêmio Jabuti.

Especialista no mercado e nos negócios do vinhos, fazendo palestras no Brasil e no exterior, em eventos como a London Wine Fair (Londres). Copello é hoje um dos palestrantes mais requisitados. Para saber mais sobre as palestras e serviços de Copello clique AQUI

  

Contato: contato@marcelocopello.com